THE BLACK PEOPLE CULTURES

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Tuesday, December 26, 2017

AS RELIGIÕES COMO RESPOSTA HUMANA AO DEUS QUE SE REVELA

           

* Indication of biography about this matter for personal deepening:

. SECOND VATICAN COUNCIL, 1962-1965, Vatican City. Nostra Aetate. Available in, http://www.vatican.va/archive/hist_councils/ii_vatican_council/documents/vat-ii_decl_19651028_nostra-aetate_en.htmlAccess on 08 de dec. 2017.
. ______. Dignitatis Humanae. Available in:
. CONSENTINO, Francesco. Immaginare Dio. Assisi: Cittadella Editrice, 2010.
. LA BIBBIA DI GERUSALEMME. Bologna: Centro Editoriale Dehoniano, 1977.
. LIBÂNIO, João Batista. Deus e os homens: os seus caminhos. Petrópolis: Vozes, 1990.
. _______. Teologia da revelação a partir da modernidade. São Paulo: Loyola, 1992.
. PANGRAZZI, Arnaldo (Org). Salute, malattia e morte nelle grandi religioni. Torino: Ed. Camilliane, 2002.
. PANIKER, Thomas. Theology of revelation and faith.   Available in,
. SANNA, I. Teologia come esperienza di Dio: la prospettiva cristologica di Karl Rahner. Brescia: Queriniana, 1997.
. SPINELLA, G. Si può parlare di rivelazione nelle altre religioni? Disponível em:
. TEIXEIRA, Faustino. Deus não tem religião. Disponível em: http://www.ihu.unisinos.br/?catid=0&id=553135. Acesso em 26 dez. 2017.
. TORRES QUEIRUGA, Andrés. A revelação de Deus na realização humana. São Paulo: Paulus, 1995.
.  _______. O diálogo das religiões. São Paulo: Paulus, 1997.
. _______. Repensar o pluralismo: da inculturação à inreligionação. Concilium, Petrópolis-RJ, n. 319, p.110-113, jan. 2007.
. _______ . Repensar a revelação. São Paulo: Paulinas, 2010.
. VIGIL, José María. Escritos sobre pluralismo.  Disponível em:
. WIKIPEDIA. Hierofania. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Hierofania. Acesso em 07 de dez. 2017. 


           Deus se revela por amor e bondade, fazendo-se próximo ao ser humano. É por uma divina intuição que ele faz a descoberta desta presença e, nesse sentido, as religiões têm contribuído muito. É nelas que o ser humano consegue expressar os seus profundos anseios, seus maiores segredos, desejos, sonhos, aspirações e carências, fazendo a experiência do Deus que se faz encontrar como uma presença que plenifica. É a partir do significado (ou significados) da palavra religião que podemos entender o papel desta instituição na relação entre o Deus que se revela e o ser humano que acolhe e responde a esta revelação na medida de sua capacidade de criatura[1]. “O escritor cristão Lattanzio faz derivar o conceito religião da palavra religare (= restabelecimento da relação entre o ser humano e Deus); Durkheim a define como “um sistema comum de crenças e de práticas relativas a coisas sacras”[2]. Embora são duas posições distintas, trazem um elemento comum no que se refere à finalidade da religião: favorecer ao ser humano a experiência do sagrado, do mistério que envolve a sua existência e que ao mesmo tempo o ultrapassa, conforme se expressa o Concílio Vaticano II na declaração Nostra Aetate:

Os homens esperam, das diversas religiões, uma resposta aos recônditos enigmas da condição humana, que ontem como hoje perturbam profundamente o coração humano: Que é o homem? Qual o sentido e o fim da vida? (...) Qual o caminho para chegar à verdadeira felicidade? Que é a morte, o juízo e a retribuição depois da morte? Em que consiste, afinal, o mistério último e inefável que envolve a nossa existência, do qual tiramos a nossa origem e para o qual nos encaminhamos? (NA 1).

          Uma das grandes verdades que as religiões nos fazem refletir é que o ser humano - pela sua origem, estrutura e destino - é “capaz de Deus”. Isso quer dizer que pela sua natureza, o ser humano há a capacidade de acolher a revelação/proximidade divina[3] e, que mesmo sendo finito, é considerado “o ser da transcendência”, pois toda a sua existência está projetada para um horizonte muito além do que ele pode abarcar[4]. Por isso que, de todas as experiências que o ser humano vive, nenhuma o envolve tanto com este mistério como faz a experiência religiosa. Mas o fato de considerarmos a experiência religiosa um “lugar” - e “lugar privilegiado” - onde a realidade e a vontade de Deus se manifestam, não quer dizer que o Mistério escondido que aí se revela, seja torna totalmente transparente[5].

Desde o início do mundo, mulher e homem nasceram e foram amparados e promovidos pelo amor incondicional do Deus da revelação. As religiões, no fundo, buscam configurar de forma visível esta descoberta sendo uma “tomada de consciência da presença do divino no mundo”[6]; presença esta, que não é passiva nem estática. Pelo contrário, envolve todo o universo num processo de contínua renovação. “O sujeito religioso (...) interpreta sua busca de Deus como suscitada por um prévio encontro com ele e no qual Deus mesmo tomou a iniciativa”[7]. Em outras palavras, a experiência religiosa é provocada pelo próprio Deus que se antecipa ao coração humano, suscitando o desejo por ele. Por isso a pessoa verdadeiramente religiosa proclama sempre que é Deus quem fala, ama, solicita, perdoa, sustenta e que ela apenas responde na fé, na oração, no louvor e na adoração[8]. Neste sentido, a religião tem sido uma preciosa facilitadora, pois

(...) faz ressoar dentro do ser humano a voz de Deus que o anima, o chama à vida e à comunhão, a uma plenitude que inicia na história e que responde ao desejo de eternidade de todo ser humano. Transmite elementos que possibilitam às pessoas experiências significativas. Responde-lhes as perguntas mais profundas e sérias da vida, tais como a presença do mal, da morte, da iniquidade, de um lado, e o desejo de felicidade, de eternidade de outro[9].

Na religião, Deus é experimentado como ‘transcendência’ que sai ao encontro do ser humano, facilitando uma experiência totalizante. Por isso, toda religião se considera revelada[10]. A razão disso é que cada uma se apresenta como ‘tomada de consciência da presença de Deus’ no indivíduo, na sociedade e no mundo. Uma religião real e autêntica proporcionará experiência sempre numa dupla sensação: de transcendência, ante o mistério que nela se faz presente; e de imanência, enquanto vemos que este fazer-se presente se refere à existência concreta do ser humano[11].  Por isso, Torres Queiruga, afirma que

o ser humano não se sente nunca o criador dessa experiência, mas seu receptor. As manifestações são diversas, contudo tem sempre algo em comum: são vividas como dom que se recebe, como presente que se acolhe. E, justamente, à medida que esse dom e esse presente se referem à descoberta do divino que se manifesta, são revelação[12].

Os elementos que retratam a manifestação divina, nas diferentes formas religiosas, obedecem a contextos determinados[13]. Objetos, por exemplo, que em algumas religiões se revestem de sacralidade, para outras, nada significam. “A pluralidade de religiões pede uma pluralidade de mediações reveladoras, cada uma legítima ao seu próprio modo, dependendo da gratuidade do dom de Deus e da originalidade da resposta humana”[14]. Nas religiões mais antigas, as hierofanias[15] acontecem de forma bem narrada e rica, através de ritos, mitos, animais, plantas, os mais diferentes objetos, lugares, pessoas, símbolos, etc. Um exemplo concreto neste sentido são as Religiões Tradicionais Africanas. Assim, o processo revelador se dá 

(...) desde o rito no qual se presencializa a ação primordial divina, até o mito, que converte a experiência do Sagrado em expressão fabuladora; desde a oração, onde o Divino se faz presença dialogante, até a ação moral, onde é simples presença que manda, ampara ou julga; desde o templo e os lugares sagrados, em que a presença se configura, até as mil modalidades de hierofanias, em que aparece a infinita riqueza de seu rosto, ou até mesmo o tabu, no qual se manifesta o aspecto negativo de seu poder.[16]

Deste modo, as religiões são acolhida e resposta humana à real e reveladora presença divina[17]. Embora Deus, em sua manifestação, não se limite nestes aspectos, citados acima, Ele se serve também deles para comunicar-se com as pessoas, revelando-lhes seus desígnios de amor. Esses desígnios vão sendo assimilados pelos fiéis das diversas religiões através dos meios orientadores para a vida que lhes são oferecidos em vista de uma plena realização pessoal e comunitária. Por isso, Torres Queiruga considera que “todas as religiões são verdadeiras. Não porque tudo nelas (...) o seja, mas na medida real em que acolhem a Presença”[18]. Sabemos que em meio a ações louváveis, as religiões apresentam muitas vezes aberrações teóricas e perversões práticas, mas, acima de tudo,

(...) são totalidades complexas de resposta ao divino, ‘com suas diferentes formas de experiência religiosa, seus próprios mitos e símbolos, seus sistemas teológicos, suas liturgias e sua arte, suas éticas e estilos de vida, suas escrituras e tradições - todos elementos que interagem e se reforçam mutuamente. E estas totalidades diferentes constituem diversas respostas humanas, no contexto das diferentes culturas ou formas de vida humana, à mesma realidade divina, infinita e transcendente.[19]

Como já se sabe, a revelação não apareceu como palavra feita, um oráculo da divindade escutado por um vidente ou como se fosse um ditado divino, segundo a concepção tradicional, “mas como experiência viva, como ‘dar-se conta’ a partir das sugestões e necessidades do que estava em volta e apoiada no contato misterioso com o sagrado”[20].  Também o autor Francisco Consentino concorda que a revelação não se trata de comunicação de ideias ou verdades sobrenaturais, mas de um “processo que envolve a vida divina que convida o ser humano a uma relação com Deus no qual encontrar a sua identidade mais profunda”[21].

          O sentido da revelação será mais intensamente vivenciado se, por trás do elemento natural e da abundância de dons recebidos, as pessoas conseguirem descobrir o Deus que os concede e os faz acontecer ininterruptamente. A experiência religiosa, com todos os seus elementos, não somente ajuda o ser humano a se ‘dar conta’ da presença de Deus, mas também o faz viver conforme a provocação desta presença reveladora. Em outras palavras, o ser humano religioso vai pouco a pouco sendo “modelado” segundo o tipo de experiência religiosa que faz: “como não admirar o testemunho espiritual e o esforço ascético dos grandes rishi hinduístas, dos sufi islâmicos ou a devoção e a reverência ao único Deus vivente”[22]. É admirável também o testemunho de tantas pessoas que desde o início da vida cristã vem contribuindo na construção de uma sociedade mais humana e mais fraterna a exemplo de seu mestre Jesus Cristo, no qual Deus se revela a si mesmo de modo pleno e total.

Portanto, a revelação de Deus não tem fronteiras, ou seja, Deus é livre para se revelar em outros espaços, porque justamente o seu amor é sem fronteiras[23]. É a sua absoluta liberdade que o leva a escolher quando, onde, como e a quem revelar-se. Cada experiência reveladora pode ser diferente de lugar a lugar, de geração a geração, de religião a religião e até de pessoa a pessoa. Quando Deus se revela, não segue nenhuma rubrica fixa e não pode nos obrigar a seguir alguma[24]. Inclusive a nossa própria liberdade tem suas raízes no seu jeito amoroso de se revelar, como expressa muito bem o Concilio em sua declaração Dignitatis Humanae:  “A liberdade religiosa tem seu fundamento da dignidade da pessoa humana (...) Esta doutrina sobre a liberdade tem suas raízes na Revelação divina” (DH, 9). É vontade de Deus revelar-se nas e através das religiões para que seus bilhões de filhos de filhas experimentem, na fé, seus constantes auxílios. Por isso é que ninguém pode pretender fechar em suas concepções limitadas o jeito ilimitado e criativo de Deus se revelar.

Author: Josuel dos Santos Boaventura PSDP - Fr Ndega
Theological review: ThD Fr Luis Carlos Susin




[1] Segundo a perspectiva de Karl Rahner, “aquilo que o ser humano percebe é sempre automaticamente ligado com as categorias e as estruturas da sua capacidade cognoscitiva” (RAHNER, K. apud SANNA, I. Op. cit., p. 107).
[2] PANGRAZZI, Arnaldo (Org). Op. cit., p. 5.
[3] “Para Karl Rahner, se existe uma revelação de Deus no sentido mencionado, então desde sempre a criatura humana possui na sua estrutura antropológica, as condições para ser aberta e orientada a uma tal revelação e para poder acolhê-la” (CONSENTINO, F. Op. cit., p. 19).
[4] Cf. Ibid., p. 20. Continuando a sua reflexão, assim se expressa este autor na página seguinte: “Se o ser humano é aberto e orientado à revelação de Deus e esta última compreende entre outras coisas um cumprimento e uma plena realização do ser humano, então mesmo de modo implícito afirmamos que Deus é uma necessidade humana enquanto o ser humano há necessidade de Deus” (Ibid., p. 21).
[5] Cf. PANIKER, T. Op. cit., p. 2.
[6] TORRES QUEIRUGA, A. A revelação de Deus na realização humana, p. 21.
[7] MARTIN VELASCO, J. apud TORRES QUEIRUGA, A. A revelação de Deus na realização humana, p. 22.
[8] Cf. TORRES QUEIRUGA, A. Repensar a revelação, p. 214.
[9] LIBÂNIO, J. B. Teologia da Revelação a partir da Modernidade, p. 268.
[10] Cf. TORRES QUEIRUGA, A. Repensar a revelação, p. 173. O conceito de revelação que procuramos considerar aqui é amplamente desenvolvido pela Teologia do Pluralismo Religioso. Trata-se de um paradigma atual de reflexão que convida a teologia a romper com os esquemas tradicionais, considerando a positividade das outras religiões. Esta é uma tarefa que exige do teólogo abertura e coragem. O autor Faustino Teixeira ver esta realidade com bastante otimismo ao considerar que estamos “vivendo uma situação inédita, uma situação que suscita uma nova sensibilidade, levando-nos a reconhecer a presença de Deus e da Sua graça nas diversas tradições religiosas” (TEIXEIRA, F. Op. cit., p. 2). Nesta mesma linha, citamos também um trecho dos escritos do autor José María Vigil, o qual diz que, “partindo do fundamento de um novo conceito de “revelação” mais realista, menos ditada e mais humana, a TPR descobre a presença de Deus atuando em todos os povos, um Deus que se é, é de todos, e de ninguém em exclusivo. As religiões não são todas iguais – é obvio - nem são todas a mesma, mas sim respondem, por caminhos próprios e particulares, a uma necessidade humana básica de busca da dimensão de profundidade existencial”. (VIGIL, J. M. Op. cit., p. 86).
[11] “Cada religião há uma história própria e um estatuto próprio, mas o que as une e está no centro da sua atenção è a preocupação com a salvação do ser humano e o seu encontro com o transcendente, Deus e o Divino” (PANGRAZZI, A. (Org). Op. cit., p5).
[12] TORRES QUEIRUGA, A. A revelação de Deus na realização humana, p. 21.
[13] Tomando como referência o contexto de Índia, o autor Thomas Paniker assim se expressa: “Em nosso contexto de pluralismo religioso nós realizamos aquilo que é normativo em toda experiência reveladora: a experiência genuína do transcendente, e o encontro de um Deus que acolhe a nossa busca transcendental com um dar-se amoroso” (PANIKER, T. Op. cit., p. 7).
[14] Ibid., p. 7.
[15]  Segundo a Wikipédia, A palavra Hierofania vem do grego hieros (ἱερός) que quer dizer sagrado e “faneia” (φαίνειν) quer dizer manifesto; portanto, pode ser definido como o ato de manifestação do sagrado. Quem primeiro usou este termo foi Mircea Eliade em seu livro Traité d'histoire des religions (1949) (cf. Wikipédia, Hierofania). Este fenômeno revelador é muito sintonizado com o contexto das pessoas envolvidas, como se expressa muito bem o teólogo João Batista Libânio (de saudosa memória): “O momento histórico e cultural de um povo é decisivo para as suas hierofanias. Assim os povos nômades, que viviam mais da caça, eram obsessionados pela figura do animal. Ou sacralizavam algum animal, em geral feroz, ou invocavam um “Senhor dos animais” (...) Outros povos já sedentarizados, envolvidos com a agricultura, cercam a natureza de mistérios sagrados com ritos de fecundidade ou fertilidades com divinizações de fenômenos naturais ou de astros” (LIBÂNIO, J. B. Deus e os..., p. 142s).
[16] Id. Repensar a revelação, p.  25s.
[17] Cf. TORRES QUEIRUGA, A. Repensar o pluralismo: da inculturação à inreligionação, p. 112.
[18] Ibid., p. 112
[19] Id. O diálogo das religiões, p. 16.
[20] Id. Repensar a revelação, p. 71.
[21] CONSENTINO, F. Op. cit., p. 19.
[22] SPINELLA, G. Op. cit., p. 3. 
[23] “Em verdade estou me dando conta que Deus não faz discriminação de pessoas, mas aceita quem o teme e pratica a justiça de qualquer povo a que pertença” (Atti, 10, 34-35).
[24] Cf. PANIKER, T. Op. cit., p.7.

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